sábado, 11 de setembro de 2010

Cuba, o fim de uma era?

Para Ler e refletir -

Texto extraído do Editorial da Gazeta do Povo - Edição 11/09/2010

Foi com surpresa que, em janeiro de 1959, um jovem barbudo chamado Fidel Castro entrou triunfalmente em Havana, a capital de Cuba, liderando um movimento armado e popular que derrubou o governo do presidente Fulgêncio Batista. Foi com a mesma surpresa que, logo em seguida, esse mesmo líder anunciou um processo revolucionário e a implantação, nessa ilha do Caribe, de um sistema socialista. Com o mesmo assombro, deixou o Ocidente atônito, quando, em outubro de 1962, descobriu-se que Cuba havia permitido a instalação de mísseis nucleares soviéticos na ilha.

Desde então, há mais de 50 anos, Fidel Castro vem deixando pasmo o mundo com sua retórica belicista, o expurgo, prisão e morte dos opositores do regime e diante da própria sobrevivência da ilha, em meio ao embargo mortal dos Estados Unidos, imposto em represália ao episódio dos mísseis. Surpreenderam igualmente a sua renúncia ao comando do país, em fevereiro de 2008, e sua sobrevida a uma grave doença que era tida como irreversível. Mesmo depois de tudo isso, no ocaso da aposentadoria, aos 84 anos, Fidel voltou a surpreender a todos, no meio da semana, ao admitir com todas as letras que “o modelo cubano nem sequer funciona para nós”, nas palavras dele. Na quarta-feira, o jornalista Jeffrey Goldberg escreveu no blog da revista The Atlantic que perguntou a Fidel se ainda valeria a pena exportar o modelo comunista cubano para outros países. “O modelo não funciona mais nem para nós”, respondeu o ex-ditador, segundo o jornalista.

Ontem, em nova entrevista, Fidel voltou atrás em sua declaração e afirmou que seus comentários foram “mal interpretados”. Apesar disso, disse continuar achando Goldberg um grande jornalista: “Ele não inventa frases, ele as transmite e interpreta.” Em suas novas afirmações, Fidel disse ainda que é o sistema capitalista que não funciona. “Minha ideia, como to­­do o mundo conhece, é de que é o sistema capitalista que já não serve nem para os Estados Unidos nem para o mundo e que conduz a crises cada vez mais graves, globais e repetidas, das quais não se pode escapar”, indicou. “Como um sistema semelhante poderia servir para um país socialista como Cuba?”, questionou.

Agora fica a dúvida se o ditador cubano se arrependeu das declarações ou se houve realmente má interpretação do jornalista. De qualquer forma, o fato é que, se realmente por algum momento Fidel reconheceu o fracasso do modelo de socialismo que implantou a ferro e fogo e sempre defendeu com determinação, ele pode ter dado mais um passo para o fim de uma época e a inexorável retomada de Cuba em direção à democracia. Na verdade, seria um reconhecimento mais do que tardio porque a realidade da ilha já mais que transbordou sobre a própria cabeça. Os resultados de 51 anos de regime ditatorial foram desastrosos do ponto de vista social e econômico para o povo cubano; e nefastos, politicamente, para toda a América Latina.

Esse regime em frangalhos deixa dois respeitáveis “líderes-órfãos” no continente: os presidentes Hugo Chávez, da Venezuela, e Luiz Inácio Lula da Silva. Chá­­vez mais pelo folclore de ser uma cópia piorada do ditador cubano. Lula, no entanto, vai carregar uma marca negativa, que sintetiza a sua simpatia e do governo pelo castrismo e pela defesa da retórica socialista. Era quarta-feira, 24 de fevereiro passado. Enquanto o presidente visitava Cuba e se deixava fotografar ao lado dos irmãos Fidel e Raúl Castro, morria em Havana o dissidente Orlando Zapata, após mais de dois meses de jejum pela libertação de presos políticos do regime.

A sucessão de acontecimentos que se seguiu movimentou a sociedade cubana como há muito não se via, com ecos em toda a comunidade internacional, mostrando de certa forma os caminhos do futuro. O colega Guillermo “Coco” Fariñas tomou o lugar de Zapata iniciando nova greve de fome, que duraria 135 dias até 8 de julho. Após reiterados apelos dos go­­vernos de Espanha, França e Costa Rica, entre ou­­tros, Havana confirmou a libertação de 52 prisioneiros de consciência. Hoje, resta saber apenas quais se­­rão as desculpas oficiais para a decretação formal do fim do regime.

Por que Cuba não deu certo? Porque o regime de Fidel Castro sempre pregou que deveria predominar, como um ente superior, uma ideologia oficial que abrangesse todos os aspectos da atividade e da existência do homem e que criticasse, de modo radical, o estado de todas as coisas; e também que dirigisse a luta pela sua “transformação”; porque a ilha foi submetida a um partido único de massa dirigido por um ditador, que sempre se misturou com a burocracia do Estado; porque implantou um sistema de terrorismo policial; porque sempre deteve o monopólio da direção de todos os meios de comunicação; porque o partido sempre quis ter o controle absoluto da economia. Porque, afinal, esmagou os direitos humanos e renunciou à democracia.

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